A escritora Antonia Pellegrino, em Cem Ideias que Não Deram em Nada, descreve o processo criativo como sucessão de formas biológicas: vírus, plantas, fungos, animais – cada reino respectivo a esses termos representa um momento do caminho de um projeto, desde a ideação até a sua efetividade. Tudo se passa como se a vida de toda ideia tivesse inscrita em si a história da evolução. Enxergando nossos próprios projetos assim, o que podemos aprender?
Ideia de taxonomia
Projetos em sonho, domínio dos aceludados, reino acytota. De penetração pacífica, representam a maior diversidade do planeta pois são capazes de infectar seres vivos de todos os domínios, sendo mais diversos que bactérias, plantas, fungos e animais juntos.
Projetos em florescimento, reino plantae. De órgãos reprodutivos chamados flores, que por sua beleza ajudam-nos a alcançar grande adaptabilidade. Expostos à luz do sol, realizam fotossíntese. De raiz axial ou pivotante para atingir maior profundidade, seu ciclo de vida pode ser longo.
Projetos em desenvolvimento, reino fungi. De estrutura pequena e modo de vida críptico, dificultando sua detecção por predadores. Estão mais perto dos animais que das plantas, mas ninguém diz. Tornam-se dotados quando frutificam, seja como bolores ou cogumelos.
Projetos realizados, reino animalia. Possuem sistema esquelético, nervoso e circulatório formado. Têm fôlego vital, mas são diferentes de humanos. É possível encontrá-los cavalgando em outros territórios que não o seu de origem.
[Cem Ideias que Não Deram em Nada, p. 79]
Poderíamos aplicar essa classificação a nossas invenções: “Neste momento, meu projeto é vírus” – e o que isso significaria? Que, de certa forma, não é nem morto nem vivo, que depende de um hospedeiro e que se modifica paradoxalmente por meio da repetição? “Neste momento, meus projetos são planta” – exigem quantias específicas de água, sol e outros suprimentos? “Neste momento, meu projeto é fungo” – espalha-se em partes pequeninas, podem matar, podem alucinar? “Neste momento, meus projetos são animais” – humanos, cordeiros ou rinocerontes, cada um com sua personalidade. Poeticamente, é possível redescobrir nossos processos criativos assim.
Um outro ponto interessante a se debater a partir do conto de Antonia é que hoje uma característica de projetos bem acabados é que se tornem virais. Isso colocaria a classificação dela de ponta-cabeça.